segunda-feira, setembro 08, 2008

sobre o riso de santorini e o resto

1. no outro dia tava dentro dum autocarro em thira a caminho de agora. não sei se se pode chamar cabelo ao que tinha mas de qualquer forma a partir daí irradiavam feixes de luz vermelho ruby com 15 dias de erosão. os mais próximos receptores desta visão sui generis - um casal columbo-helénico - aproveitavam para troçar descaradamente mesmo que fazendo transições entre idiomas (para o grego quando convinha) com o intuito apreciável de disfarçar. deles expectoravam gargalhadas estridentes ao mais rowdy estilo americano. envolto pela exaustão poupei os 60 passageiros do autocarro dum espectáculo singular e limitei-me a analisar os seus comportamentos. notavelmente, na recta final de cada gargalhada um fenómeno psicosocial, em particular da parte dele : a hesitação relativamente ao momento em que deverá ou não parar de rir, em função dela. um surto de riso genuíno (o tufo de palha vermelha suportado na minha cabeça como génese) muta-se ao longo do tempo terminando num acto cínico enraizado na insegurança ou talvez na excessiva cordialidade, o desespero por mostrar que está em sintonia, em harmonia com a cúmplice de zombaria. a terminação dela é suave, real, o seu surto de riso logarítmico, continuado na sua variação de intensidade até final. talvez ela seja mais segura de si, mais independente. pois, ele deve-se sentir inseguro...
/// espreito para trás a ver se existe algum suporte para a minha suspeição. sim, ele porta pelo menos 150 kgs, ela ainda tá consideravelmente longe do estatuto de obesidade mórbida. como se isso fosse importante... mas é... tanto para mim *confesso* como para a societas mas mais importantemente para ele, estigmatizado, espírito mutilado pelo movimento imagista da hollywood ou mtv que em meio século contaminou todas as faixas etárias ocidentalizadas. mesmo que se eleve moralmente, mesmo que se abstraia dos frequentes olhares, tem-no bem presente nas profundezas da consciência: tem um rótulo, antes e acima de tudo, é obeso. (parágrafo-monumento às considerações superficiais, vou deixar assim) \\\
1. pensei quantas vezes eu próprio faço isso, com maior ou menor intensidade (sim, às vezes perco muita energia a fingir que não tou a apanhar uma seca). os moralistas (uma estirpe venenosa que abandonei aos 16) defenderão sempre que em todo o caso é a adopção duma postura falsa e enganosa portanto condenável por princípio. de cabeça devastada por 8 meses de alcoolismo parece-me que, do ponto de vista humanista (e contrariamente ao que vem sido convencionado), o cinismo pode ser positivo. se bem executado e no contexto adequado contribui para o bem estar de outros espíritos ao contrário da simples prática da verdade crua e robótica ao serviço dum abstracto e obtuso tribunal universal que ninguém conhece nem vê. um bom cínico poderá controlar o grau de conhecimento do próximo, manipulando a sua felicidade (a condescendência prá felicidade). e outra vez a dicotomia ignorância/felicidade vs consciência/agonia.

não tenho culpa de não achar piada à maioria das merdas mas posso sempre ser altruista e não cortar o ambiente de forma austera - os cínicos dirão que o faço pela integração social?
POR 1945

2 comentários:

Cheguevara disse...

Aqui fica a minha venia a este post...

Sendo que esse senhor ja foi varias vezes atacado na vida, devido á sua obesidade, custa-me a perceber que faça o mesmo a outros.

Ainda para mais sem ter sido alvo de chacota. Atacou qnd o ambiente era pacifico, nada hostil e dps queixam-se...

Espero que esse individuo nao chegue a arbitro ou policia, ia ser bonito ia...

Os cinicos dirao que o meu comentario tem algo de recalcado ou um trauma na sua genese, eu digo que nao... apesar da minha expulsao!

Pedro Gomes disse...

Epa, imaginando-me eu na tua pele nesse momento (o que é dificil visto que nao sou marado ao ponto de pintar o cabelo de vermelho, lol mas nunca se sabe...) calmamente olharia para o casal e ria-me descontraidamente ao mesmo tempo que diria pacificamente em bom portugues "tens uma moral pra te rir oh balofo do c*ralho! eu amanha posso rapar isto!!"...

Criar-se-ia um tipo de equilibrio jocoso naquele autocarro... e pronto!

É de nossa natureza avaliar, julgar tudo o que nos rodeia... daí muitas vezes o "politicamente correcto" nao encaixar mto bem na minha filosofia de vida...

Finalizando, DK, uma vez mais, excelente post! Venham mais...